domingo, 28 de novembro de 2010

Saber (um pouco de) Física: para quê?

Boa pergunta. Aqui vai um exemplo bem prático.

Digamos que você esteja lendo uma reportagem sobre "colonização de Marte" na Veja e se depare com esse quadro:















(Veja, 3 de novembro de 2010, p. 103)


Note a frase sublinhada em amarelo e pergunte-se: ela faz algum sentido?

Para responder, o leitor de Veja tem que ter claro o que significa "uma pessoa de 80 quilos pesar 50 quilos". Ou seja, a diferença entre massa e peso. Esse último depende da aceleração da gravidade, que em Marte é em torno de g_m=3,7 m/s^2 ou cerca de 38% da aceleração da gravidade na Terra g_T (como informa corretamente o quadro).

Se o leitor souber a diferença entre massa e peso, faz uma conta simples e chega à conclusão que uma pessoa de 80 kg de massa pesaria 80 x g_m=296 N em Marte e 80 x g_T = 784 N (ou 80 "quilogramas-força") na Terra (onde g_T=9,8 m/s^2). Assim, o peso dessa pessoa em Marte equivaleria ao peso de uma pessoa de massa aproximadamente igual a 30 kg (=296/9,8 ou 38% de 80 kg) na Terra.

Logo, a frase "Gravidade: 38% da gravidade da Terra. Uma pessoa de 80 quilos pesaria 50 quilos" não faz sentido: mistura um dado real com uma conta errada e ainda confunde os conceitos de massa e peso. Soa tão esquisita quanto "o zagueiro Lionel Messi da Argentina marcou 3 gols na vitória de 1 x 0 sobre o Brasil."

É quase um consenso que precisamos criar uma capacidade de "análise crítica" em nossa população através de educação e formação adequadas. Ter "capacidade de análise crítica" é justamente ter a capacidade de captar inconsistências como essa em textos ou discursos (e não "ficar criticando o tempo todo", como alguns pensam).

Essa capacidade de detectar inconsistências do brasileiro médio é extremamente aguçada em relação a alguns assuntos bem familiares, como futebol e política. O ideal seria que a formação das pessoas as permitisse fazer o mesmo com outros tópicos, como Ciências e Economia. Afinal, seria ótimo se as pessoas discutissem os "níveis de emissão de gases estufa no protocolo de Copenhaguem" ou "metas de inflação para 2011" com o mesmo "conhecimento de causa" que discutem se houve ou não pênalti em cima do Ronaldo no jogo contra o Cruzeiro.

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